1 boletim, 8 nomes, 7 candidatos
Sarin
1 boletim de voto
A ferramenta de excelência das nossas eleições. Um boletim que nos dá o poder de livremente escolhermos os nossos representantes. Um boletim onde a Democracia nos pede que assinalemos com X aquele que, dia 24 de Janeiro, queremos ver eleito como Chefe deste Estado, desta República. Apenas um X na quadrícula.
Um boletim, um voto. Secreto, pessoal, intransmissível. Por isso a nossa lei eleitoral para a Presidência da República exigir que seja presencial, para que não haja qualquer hipótese de coacção no momento de votar.
Este ano as urnas foram aos Lares de idosos, como há muito deviam ir aos Lares e Hospitais. Foram aos lares dos confinados, como há muito deviam ir aos lares dos acamados crónicos. Foram, e ainda assim...
...houve quem não pudesse votar porque fechado o prazo de inscrição a 17. Burburinho, gritos de supressão de voto... não há muitos anos, o período de recenseamento tinha prazo.
Ninguém suporta dores de crescimento em plena pandemia.
...houve quem sussurrasse ao ouvido dos velhotes qual a figura a escolher.
Não suporto paragens de crescimento em plena democracia.
8 nomes
Eduardo Baptista, o desconhecido que nos entrou boletim adentro porque se declarou candidato. E eu concordo com a CNE: se, para enviar atempadamente os boletins para todos os lugares do mundo onde há portugueses recenseados, tinham de avançar antes de confirmadas as candidaturas pelo TC, então teriam de incluir o nome de todos os que entregaram proposituras, qual a dúvida?
Só não percebo porquê marcar as entradas das candidaturas para tão tarde... afinal, a Constituição diz que devem ser entregues até 30 dias antes, não diz que têm de ser entregues 30 dias antes.
Mas já está: 8 nomes, e um não vale. Vale ser o primeiro, e valerá por nulo o assim nulo candidato das 11 proposituras em vez das 7500. Há sempre quem prefira os eduardos batistas aos votos em branco, com medo de usurpações de voto. Não os censuro.
7 candidatos
Todos debateram. Todos são conhecidos. Todos pertencem ao sistema, embora uns mais do que outros.
Ao contrário do que vou lendo, não me parece que Marcelo tenha a reeleição facilitada. Alienou a direita mais dura, que lhe não perdoa a sã convivência com o Governo dito socialista; disputa com Mayan a direita democrática, que preferirá votar em branco ou abster-se a assinalar qualquer candidatura à esquerda, apenas a dividi-los a liberalidade dos costumes e o Estado mais ou menos Social; disputa com Ana Gomes um PS fragmentado, a eterna ratoeira do centro mais ou menos liberal; e conta com um eleitorado mais temeroso da pandemia, que parece inclinado a não arriscar eventuais falhas de segurança sanitária nas quase duplicadas mesas de voto. Temo que dispute, também, a fidelidade dos católicos que se emocionam com as artes performativas de Ventura, abençoados sejam se me engano.
Já Ana Gomes tenta disputar votos a quase todos os candidatos, mas sendo o seu território natural o de Marcelo, acabou a disputar a 2 uma eleição que é a 7. Ventura, o actor sem coluna vertebral mas muita húbris e nenhum acaso, lançou o repto: "Demito-me se ficar atrás de Ana Gomes". Alguém acredita? Ana Gomes parece ter acreditado, pois apelou ao voto útil. Ana Gomes, a candidata que se lançou sem tentar diálogos com PCP e BE, apela agora à convergência. Uma convergência que apenas servirá Ventura, elevado a terceira ou quarta força política pela concentração do voto. Ventura, o aprendiz de Trump que precisa urgentemente de projecção internacional para consolidar a sua posição junto dos investidores, quero dizer, apoiantes.
O espaço de Ventura é o espaço dos fascistas e dos racistas. Será também o espaço dos que, alheados, não gostam "do sistema" e apreciam a energia da disrupção? Não, esses seguirão Vitorino Silva, Tino de Rans procurando ser Tino para Portugal com eleitores seus por mérito próprio. Porque aqueles que querem mudança não votam no racismo e no fascismo para se sentirem mais seguros, não votam nas teias obscuras dos financiamentos para se livrarem da corrupção. Vitorino disputa com Ventura os eleitores descontentes, sim, e diria que disputam atenção entre normais abstencionistas; mas apenas Vitorino receberá votos dos democratas.
Marisa Matias e João Ferreira, nascidos em espaços ideológicos próximos, têm posturas distintas entre si. Ambos se sentem confortáveis entre o seu eleitorado natural, que naturalmente não se sobrepõe, mas propõem-se conquistar votos ao centro e à abstenção. Marisa convoca simpatias por ser mulher, o voto feminista antes do voto de cidadania a oscilar entre esta e Ana Gomes. João será o que mais consciência tem do cargo a que se candidata, o discurso claro a assumi-lo candidato à Presidência da República e não a deputado, mas o anti-comunismo primário dificilmente permitirá que lhe vejam outras qualidades que não o ser comunista. Aliás, Marisa também carrega o fardo de uma História mal contada e usada como espantalho - talvez um dia Hollywood deixe de ser a fábrica de redesenhar os séculos e o Ocidente se descubra diferente.
Entretanto, temos um Presidente para eleger no dia 24 e uma Democracia para defender todos os dias.
6 sondagens
Não sei se serão seis, perdoem-me a liberdade criativa. Mas têm sido várias. Com oscilações interessantes para Ventura, devo dizer. Tal como devo dizer
que são sondagens feitas pela amostragem mínima necessária para validar quaisquer sondagens nacionais,
e que são sondagens das quais geralmente se desconhecem as dispersões demográficas,
e que são sondagens cuja margem de erro não é despicienda -
falamos de entrevistas a cerca de 650 pessoas seleccionadas por critérios que não conhecemos e cuja extrapolação tem um erro na casa dos 4%. Demasiados e, e, e para que as considere fidedignas.
5 conselhos não solicitados
Votem
As filas de dia 17 resultaram da concentração de eleitores em mesas municipais. Dia 24 as mesas estarão espalhadas por todas as freguesias, como habitualmente, e não terão mais de mil eleitores por mesa. Demorará, sim, mas valerá a pena. Lembrem-se que houve quem esperasse 48 anos para votar. Houve quem nunca tenha tido direito de voto.
Saiam de casa preparados
Saibam onde votar. Levem canetas, máscaras, desinfectante. Levem água e bolachas, até um livro por prevenção. Mas vão. E mantenham a distância. E a saúde.
Não permitam que vos condicionem o voto
Sondagens são declarações de intenção, não são votos. Votem em quem acham ser mais capaz para representar a nossa República e para nos representar a nós, a todos nós. O voto útil será para uma segunda volta, o voto inútil não existe. Todos os votos contam.
Defendam a Democracia
Não há forma de defenderem a Democracia e os Direitos Humanos onde aquela se robustece a não ser votando em candidatos democratas. Foram muitas as ideologias que construíram a Democracia. O fascismo não foi uma delas.
Fiquem bem
Porque o postal vai longo e muito teria ainda a dizer, mas. Fica para outro dia.
Por isso, sim, fiquem bem, fiquem muito bem. Com uma música que pode servir de hino quando o Hino não serve.