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sardinhaSemlata

Um espaço de pensamento livre.

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23.11.23

A vida na hora


The Travellight World

fullsizeoutput_7878Foto: Travellight | Cracóvia, Polónia

 

A vida na hora.

Cena sem ensaio.

Corpo sem medida.

Cabeça sem reflexão.

 

Não sei o papel que desempenho.

Só sei que é meu, impermutável.

 

De que trata a peça

devo adivinhar já em cena.

 

Despreparada para a honra de viver,

mal posso manter o ritmo que a peça impõe.

Improviso embora me repugne a improvisação.

Tropeço a cada passo no desconhecimento das coisas.

Meu jeito de ser cheira a província.

Meus instintos são amadorismo.

O pavor do palco, me explicando, é tanto mais humilhante.

As circunstâncias atenuantes me parecem cruéis.

 

Não dá para retirar as palavras e os reflexos,

inacabada a contagem das estrelas,

o caráter como o casaco às pressas abotoado

eis os efeitos deploráveis desta urgência.

 

Se eu pudesse ao menos praticar uma quarta-feira antes

ou ao menos repetir uma quinta-feira outra vez!

Mas já se avizinha a sexta com um roteiro que não

conheço.

Isso é justo — pergunto

(com a voz rouca porque nem sequer me foi dado pigarrear nos bastidores).

 

É ilusório pensar que esta é só uma prova rápida

feita em acomodações provisórias. Não.

De pé em meio à cena vejo como é sólida.

Me impressiona a precisão de cada acessório.

O palco giratório já opera há muito tempo.

Acenderam-se até as mais longínquas nebulosas.

Ah, não tenho dúvida de que é uma estreia.

 

E o que quer que eu faça,

vai se transformar para sempre naquilo que fiz.

 

Wislawa Szymborska

 

20.11.23

Sara Tavares: Que Chovam As Estrelas…


Filipe Vaz Correia

 

 

 

 


Morreu a Sara Tavares...

Assim, no meio deste Domingo, fui surpreendido com esta estranha e amarga notícia, este pedaço de ardor que nos leva para o passado, principalmente a minha geração, para um palco no Chuva de Estrelas, para a voz de Portugal na Eurovisão.

"Chamar a música"...

Quantas vezes não cantarolámos esta canção?

Quantas vezes, ainda, não ecoa ela dentro de nós?

A Sara Tavares foi uma das vozes mais surpreendentes e esplendorosas que ouvi na minha vida, olhar para ela através da televisão e vê-la a interpretar Whitney Houston, no mais extraordinário pormenor ficará para sempre na minha memória e acredito que de todos aqueles que vivenciaram aquele momento.

Não sabia que estava doente, nem imaginava que tão cedo este País iria ficar privado de um dos seus maiores talentos.

Sobra, como sempre nestes momentos, a sensação de vazio, de falta de tempo...

Esse tempo que de maneira impiedosa se impõe à pequenez Humana, ao pedaço de nada que nos caracteriza.

Adeus Sara...

Obrigado por tamanho talento e tamanha grandeza.

 

 

Filipe Vaz Correia

 

 

19.11.23

Onde fica o utente e o aluno?


O ultimo fecha a porta

Nos últimos meses, temos assistido a greves constantes e a um conflito entre Governo (empregador) e professores/profissionais de saúde (empregados).

No meio destas guerras intestinas que não levam a lado nenhum, quem fica a perder são os utentes e os alunos.

Isto num cenário pós pandemia onde o diagnóstico e as competências das crianças ficaram adiadas e atrasadas.

 

Não se escolhem horas para ficar doente, mas só os que têm possibilidades é que podem recorrer à saúde privada. Pagamos muitos impostos para não ter a devida correspondência em termos de serviços públicos.

É muito preocupante saber que não temos onde recorrer se adoecermos, se tivermos dores ou sintomas de que algo no nosso organismo não está bem, ou se não nos magoarmos. Esta semana ouvi um médico na Rádio Universitária do Minho a atacar as pessoas que vão aos hospitais entupir as urgências. Um discurso muito arrogante no tom e no conteúdo e que me leva a perguntar: se as pessoas (que descontam em impostos e pagam o salário aos médicos) não vão às urgências, vão onde? Ao centro de saúde onde não há consultas porque não há vaga? Ou porque o médico está de baixa?  Parece um país caótico.

 

O mesmo paralelismo pode ser feito na educação.  As escola pública vai-se degradando e abre via ao negócio privado. Como ficam os adultos de futuro?

Esta semana, um jornal alertava que os alunos universitários estão cada vez mais infantis e menos autónomos (não frequento a universidade neste momento, pelo que vou acreditar). Estas greves constantes dos professores, num certo desmazelo pela sua importante função piora ainda mais a situação. 

17.11.23

Mistério público: Quem guarda os guardas?


JB


 Hoje, para não ter que falar no derby venho falar da crise do governo.

 Bem sei que o assunto é de menor importância e interesse mas como o Sporting não ganhou, prefiro esta opção.

 Ouvi ontem com atenção o Miguel Sousa Tavares e desta vez concordei com ele. Que trapalhada é esta? Que raio de ministério público é este que julga as pessoas na praça pública de forma impune.

 Há uns tempos escrevi que a política era para muitos como se fosse futebol, pouco interessam os argumentos e a razão, apenas conta a cor da camisola. Isso é verdade para muitos e temos que nos habituar a isso mas não pode ser a verdade da justiça portuguesa.

 Não tenho muito mais a dizer sobre isto e espero estar enganado mas o historial do MP não me deixa ser otimista.

 Veremos no que vão dar estas buscas, estes comunicados, estas escutas e estas fugas para a imprensa. Acho que não vão dar em nada como infelizmente é habitual. Nada é como quem diz, claro, porque já deram para cair o governo e lançar o país numa crise política que talvez seja completamente injustificada.

 O Pedro Marques Lopes dizia num espaço de comentário que poderíamos estar perante um 'golpe de estado institucional', o que é uma acusação gravíssima e que nos devia por a todos a refletir. Na altura pareceu-me alarmista mas com o passar do tempo e o esmiuçar das supostas 'provas' cada vez me parece mais o caso.

 Hoje mais que nunca, apetece-me perguntar, com perguntava o poeta romano Juvenal, um satírico da Roma antiga:

"Quis custodiet ipsos custodes?"

 

 

JB

 

16.11.23

Ao que nada espera...


The Travellight World

fullsizeoutput_7877Foto: Travellight | Nara, Japão

 

Quero ignorado, e calmo
Por ignorado, e próprio
Por calmo, encher meus dias
De não querer mais deles.

Aos que a riqueza toca
O ouro irrita a pele.
Aos que a fama bafeja
Embacia-se a vida.

Aos que a felicidade
É sol, virá a noite.
Mas ao que nada espera
Tudo que vem é grato.

 
Fernando Pessoa