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sardinhaSemlata

Um espaço de pensamento livre.

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Um espaço de pensamento livre.

31.08.24

E depois de agosto, mais nada?!


Ana D.

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Agosto, passou rápido e com ele levou as férias e tantos temas como a fuga dos turistas portugueses do Algarve, o preço da bola de berlim, uma descida no IRS e um sismo que abanou boa parte do território nacional como se pode ver neste shakemap, deixando-nos ainda agora abalados com o que não aconteceu, à beira da rentrée. Uma rentrée onde se espera fazer alguma coisa, do tanto que ainda está por fazer. E há mesmo muito por fazer (não cabe é nos tais quatro meses). Mas adiante, que o que importa é para a frente no tempo, caminhar. 

Todos os setores estruturais estão à mingua e sequiosos de medidas efetivas. Vamos ver se se consegue começar o ano letivo com algumas melhorias e maior serenidade também para pais e alunos, não obstante a falta de professores que já sabemos ser assunto que não se resolve com um estalar de dedos ou sequer com a mudança da hora. E ainda que com os dias menores e quiça menos solarengos do outono e as folhas a cair, siga-se então para a discussão do Orçamento e se possível também para a sua aprovação, de modo que o país não fique novamente "congelado" à mercê de eleições e principalmente da conjuntura que os períodos eleitorais determinam. E assim, logo, logo, enquanto vemos o país a crescer acima do crescimento da Zona Euro como prevê o Banco de Portugal, a inflação a descer e a Euribor a aliviar para algum (pequeno) descanso das famílias, o tempo vai passando e quando dermos conta, será tempo de receber a visita do Inverno, que como acontece todos os anos, vem para passar o Natal em família.

27.08.24

A Filosofia de um Abanão


Bruno

Peter Paul Rubens -Der Höllensturz der Verdammte

Peter Paul Rubens -Der Höllensturz der Verdammten ("A Queda dos Condenados") -Alte Pinakothek - Pormenor

Imagem: ©Bruno Nunes dos Santos

 

Tirando-o da certeza da desordem e largando-o numa desordem de incertezas.

Khalid Hosseini, in "O Menino de Cabul"

 

Em tempos, andava eu pelo ISCTE, e um professor marcava uma data de exame quando de repente, e no âmbito de um Mestrado, a vasta maioria da turma apelava de forma furisca à transformação daquele mesmo exame num trabalho de grupo. Face a tal argumentação - onde não tomei parte, pois os trabalhos de grupo são interessantes para pseudo-investigadores de tudo e de nada ou então para indivíduos que têm “frequentador de mestrados e doutoramentos” como profissão e consequentemente muito tempo disponível - o professor apresenta-nos a seguinte questão: “um dia, quando tiverem um grande problema em mãos, um desafio daqueles que tem de ser resolvido na hora, vocês vão parar e dizer: vamos criar um grupo de trabalho”.

 

Na verdade, tal acaba por ser a constatação de uma triste realidade. Não tenho por hábito percorrer a espuma dos dias, mas face a um episódio de terramoto na região centro e sul do país, parece que foram muitos os que optaram pelo grupo de trabalho, isto em meu entender, que não sou especialista na matéria e a maior proximidade que tenho com sismos foi um pequeno abalo nos Açores, e dois abanões daqueles em Istambul e numa fronteira a médio-oriente pouco recomendável. E lembro-me agora de outro, foi no dia em que conheci a Sophie Marceau.

 

Sempre pensei que um dos objetivos da comunicação face a uma crise, e neste caso em particular uma crise sísmica, fosse a manutenção da calma. Não obstante, a reacção de alguns políticos e de técnicos foi de pânico intercalada com uma sede de aparecer. Já vimos como é que isto acaba, como também já ficámos a saber que alguns que dizem dormir poucas horas por noite, afinal… Este episódio nem uma crise foi, mas a reacção desmesurada e o “olhem para mim, também estou aqui” não é aceitável. Continuamos a ser provincianos e já nem entre a Arcada e São Bento estamos salvos da paisagem. Hoje, o João da Ega ficaria sem argumentação e muito provavelmente até aplaudiria um "rebola txi txon".

 

Alguém também está a pensar no grupo de trabalho quando privilegia uma rede social em detrimento de canais de comunicação muito mais eficientes. Temos rádio e televisão, sendo que o primeiro é sempre a forma mais segura de transmitir informações em tempo de crise. E não precisamos todos de ter rádio, qualquer telemóvel tem e nem precisa de internet - além de que vimos como rapidamente o site da Autoridade Nacional de Proteção Civil teve um crash. É importante lembrar que para lá dos privados, o Estado tem canais de televisão e estações de rádio, muitas delas inúteis e completamente carregadas de ideologia e que portanto, o mínimo expectável seria que funcionassem em situações de emergência - até porque todos pagamos para isso na fatura da electricidade e não só. O ideal seria ver pessoas, tranquilamente nas praças depois de tamanha ocorrência e não fechadas dentro de edifícios sem sequer se abrigarem debaixo de uma mesa à espera de um reel ou de um influencer em estilo parolo a guiar as pessoas para os centros comerciais ou para o restaurante da moda para petiscarem aquelas comidas servidas em tachinhos e escorredores de batatas fritas.

 

Triste é também vermos mais que um jornalista a perguntar porque é que não se colocou informação no Twitter, agora X - não fosse um grupo de pseudo-intelectuais e alguns corporativismos bacocos andarem pela rede a tal hora a espalharem em meia dúzia de caracteres toda a sua sabedoria e intelectualidade. Também assim ficamos a perceber porque é que aquilo que realmente importa não passa na televisão, na rádio e muito menos nos jornais, afinal onde tudo já é comentário ou publicidade, de facto a melhor fonte de notícias será o Twitter.

 

Falando em jornalismo, às seis da manhã já temos especialistas de tudo a falar de construção, de protecção civil, de réplicas, de quando será um terramoto à séria, do que poderia ter acontecido, da reacção das formigas aos abanões, do estado de espírito dos peixes quando vão na crista do tsunami, do pânico do Boby da D. Umbelina, sem esquecer os especialistas da saúde mental a falar dos traumas de um abanão mais um sem número de banalidades em torno das crianças, das companhias de seguros que em minutos despejaram textos e textos sobre a importância de ter um seguro... e pensar que o saudoso Professor Bitaites iria deixar tantos seguidores. A diferença é que o Professor Bitaites não estupidificava a audiência. Começo a pensar que o sismo, e depois de ter assistido a comportamentos tão estranhos, foi encomendado e teria que ser em Lisboa para ter aquele impacto. É que ainda a "barraca abana" e já temos CEO de seguradoras a postar no LinkedIn, especialistas na posse de toda a "informação" a dar o parecer e altas figuras do Estado a desfilarem na passadeira... Uma coisa é certa, e talvez eu não tenha assistido, mas desta vez não houve o habitual desfile dos coletes laranjas.

 

A tudo isto alia-se a louca vozearia, somos um país de carpideiras e mulheres de soalheiro dramáticas (na verdade, nada se passou de dramático). Tivemos mais pânico em meia dúzia de horas por causa de um pequeno sismo do que com a destruição de um património natural único no mundo durante mais de uma semana na Madeira. A Madeira, essa ilha onde os capos da Cosa Nostra fazem estágio antes de abraçarem a actividade na sua ilha.

 

O que verdadeiramente me deixa em pânico, é o facto de que num território de alto risco em termos de actividade sísmica, a maior parte dos seus habitantes não tenha a mínima ideia do que deve fazer, afinal, o conhecimento e a resposta deve estar só com as almas iluminadas - na Coreia do Norte e em tantas outras geografias também é assim, sobretudo quando a tragédia acontece e à boa maneira de José Rodrigues dos Santos, abrem os telejornais com um “Morreram Todos!”.

 

Num país onde nada de relevante acontece (mas tanta outra coisa tem lugar), precisamos mesmo de um valente abanão ou de uma grande onda que nos acorde para a realidade. E que tal criarmos um grupo de trabalho para isso?

 

P.S.: a próxima pessoa que me perguntar se senti o terramoto, não tenho a mínima dúvida que vai conhecer o epicentro do mesmo em segundos. 

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Para ler: esta semana deu-me para a dramaturgia e bem a propósito lembrei-me de pegar em “One for the Road” de Harold Pinter. Como referi, bem a propósito.

Para ouvir: foi a minha companhia de viagem na madrugada de domingo, a Senhora Vanoni no seu albúm “adesso”, gravado ao vivo. O medley que junta “Che cosa c’è”, “Senza Fine”, “Dettagli”, “L’appuntamento”, “Vedrai vedrai” e “Domani è un altro giorno” deveria ser Património da Humanidade.

Para apreciar: um dos grandes eventos a Norte e no ambiente único da Póvoa de Lanhoso. A Romaria de Nossa Senhora do Porto D’Ave é uma combinação singular de religioso e profano e onde toda a envolvência pode ser degustada na companhia de um verde e de um “Bife à Romaria”.

Para beber: não é um vinho para ganhar o prémio de melhor vinho verde do mundo, mas acompanha bem uma refeição de Verão e ainda melhor as maçãs da quinta que lhe dá o nome. O Quinta de Argemil Loureiro , nascido entre Barcelos e Esposende, é uma boa companhia para aquelas tardes...

26.08.24

As Saudades Da "Minha" Sardinha...


Filipe Vaz Correia

 

 

Férias, doces férias...

Neste mês de Agosto, plantado ao sol Lusitano, não consegui cumprir as minhas obrigações nesta SardinhaSemlata, por entre, mergulhos e cozinhados fui desfrutar de amigos e família transformando dias em memórias, misturadas entre conversas e gargalhadas.

Confesso que tinha saudades de aqui regressar, semana após semana, para partilhar curiosidades e opiniões, umas mais conseguidas que outras mas sempre sinceras e esforçadas.

Por entre prosa e poesia aqui voltarei na próxima semana, em modo Sardinhada, para a reentré de Setembro com a esperança de que a minha primeira crónica possa relatar a vitória do meu Sporting no jogo importantíssimo contra o Porto em Alvalade.

Até lá...

Um abraço com amizade para todos os que seguem estes SardinhaSemlata.

PS. Um agradecimento especial para a nossa Ana D e para o nosso Bruno que seja em modo férias ou não, ao contrário deste que vos escreve, nunca falham com a seu texto nesta viagem que se transformou este blog.

 

Filipe Vaz Correia

 

 

 

 

20.08.24

Por Estes Dias Andará um Pastor Belga Malinois em Douchy...


Bruno

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©alaindelonlife.tumblr.com

 

Quando sabes da morte, não cresces mais.

Domenico Starnone, in "Vida Mortal e Imortal da Rapariga de Milão"

 

 

Este não será um texto de idolatria de alguém que parte, algo muito comum e que no caso de Alain Delon, muitos daqueles que já possuem epitáfios preparados ainda os indivíduos não dão sinais de morte se devem ter esquecido. A caça ao like (ou a necessidade de dar sinal de vida para não desaparecer) em Agosto não se rentabiliza com homenagens a músicos, actores ou sequer outros indivíduos que partem e cuja obra ignoramos mas que fica bem dizer que conhecemos já desde pequeninos. Em Agosto é tempo de praia e de carpir lágrimas pelos incêndios enquanto estamos na areia a apreciar a fumaça bem lá ao longe, além de que aplaudir Delon, em alguns  pode causar alguns danos na carreira

 

Mas não vou exaltar Alain Delon, actor que nem apreciei muito, e cujo contacto inicial com o mesmo se deu com “Il Gattopardo”de Visconti. Tancredi, louco apaixonado pela rebeldia de Garibaldi, rapidamente se começa a deixar corroer pelos vícios do novo status ou melhor, de uma espécie de manutenção do antigo mas apenas com mudança das personagens.

 

Hoje abordo Alain Delon pela sua paixão pelos cães… Pelo seu som preferido, o uivo do lobo e pela tremenda amizade que o ser-humano estabeleceu com os caninos. Aliás, é na quinta de Douchy que estão sepultados mais de cinquenta companheiros do actor. Talvez Delon tivesse a irreverência destes companheiros, da forma como descomplicam a vida, se é que a encaram como tal e sem sequer terem em conta o factor tempo, essa invenção humana. Uma invenção humana com mais uma recente validação (ou desvalorização) cientifica e que de repente mostra que aqueles tontos que o negavam esse mesmo tempo, afinal… Sim, o tempo não existe… Estranho, mas parece mesmo não existir. É na ausência desse tempo que Delon muito provavelmente irá partilhar o espaço com os seus companheiros.

 

A paixão pelos cães levou Delon a cometer muitas loucuras, algumas até em demasia com solicitar a eutanásia de um cão para que o acompanhasse na sua última morada. Na verdade, é possível amar os cães sem ser extremista e sem lhes retirar aquilo que realmente os caracteriza, não invalidando que hoje em dia já não podemos afirmar que temos cães com cem por cento dos seus instintos. Não obstante, ainda podemos entrar na discussão de que estão longe de ser descendentes dos lobos e que não são mais que uma criação humana. Talvez tema para um outro dia.

 

Na verdade, muito do que sou, devo-o aos companheiros cães que me acompanharam ao longo da vida e muitas das lições mais preciosas que guardo também as devo a tão peculiares personagens. Talvez seja isso, o simples facto de viverem, de nem sequer saberem que um dia vão partir (e a vida destes é tão breve) e da forma como superam os maus momentos. Como tudo é simples e no final, como na verdade nós não merecemos amigos tão dedicados… A nossa dívida para com estes é gigantesca e não existem milénios suficientes para pagar a mesma.

 

Por estes dias, não tenho a minima dúvida que anda um Pastor Belga Malinois algures por Douchy a aborrecer e a correr atrás de cinquentas cães que aí partilham um espaço. Esse Malinois é a reencarnação de Delon como há muitos anos este desejou. Não sendo eu crente, também quiçá um dia possa renascer como um Pastor Alemão. Quiçá um dia, por Douchy, todos estes cães possam correr e cometer inúmeras diabruras, umas num espírito mais humano e rebelde, outros na sua pura essência de serem cães… Talvez também nós pudéssemos correr um pouco pelos campos com algum espírito canídeo, não tenho a mínima dúvida que o mundo seria um lugar bem melhor.

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Para ver: de Henri Verneuil e baseado na obra de Auguste Le Breton, e claro, com Alain Delon,  Le clan des Siciliens” merece um tempo das nossas vidas. Um filme de mafiosos de 1969, mas daqueles bons.

Para ler: para além da majestosa escrita e da história, foi um livro que me aguçou a curiosidade e me fez penetrar mais a fundo a beleza das pequenas vilas e paisagens de Abruzzo e também de sair de Roma e explorar Lazio. “Il Trionfo Della Morte” de Gabriele D’Annunzio. Um dos melhores da literatura italiana e europeia dos finais do século XIX início do século XX.

Para ouvir: não querendo insistir em Ennio Morricone, mas não podia deixar passar a banda sonora do filme “Le Clan de Siciliens”. Uma daquelas coisas soberbas de Morricone e bem ao estilo de muitas OST daqueles tempos.

Para usufruir: um projeto fantástico em Pontevedra mas que é de toda a Galiza: Salmoira. Este é mais que um projeto de turismo, é um projeto gastronómico alicerçado na salga (salazón) e para além da componente de investigação organiza food tours, experiências imersivas, provas e um sem número de actividades verdadeiramente interessantes. Imperdível e tão perto da fronteira.

Para aproveitar (e também lamentar):  espero que a partida da D. Alice não seja o fim do "Procópio". É a melhor homenagem que lhe podemos fazer, é por lá andar de vez em quando de copo ou tosta na mão.

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