A Minha Avó Dulce
Rita PN
Não é um inédito, mas sim uma republicação de um texto relativamente recente que partilhei no meu blog. Contudo, ouso trazê-lo aqui não só pela temática, mas também pela impotância que lhe atribuo, atendendo à eventulidade de ter mais alguns leitores. Homenagear a minha avó é homenagear a coragem e a audácia, o caminho da verdade, da liberdade e da democracia.
Decidi a partilha ainda antes da morte do Presidente Jorge Sampaio, uma das suas pessoas de referência , a par de Mário Soares. Estarão, agora juntos, os três.
Só posso saber quem sou e para onde vou, sabendo de onde vim.
Escreveu para todos os jornais a baixo retratados, entre 1964 e 1987, com maior incidência entre 1974 e 1975.
Para os mais distraídos, o espaço temporal coincide com a entrada em decadência do regime Salazarista (no início da década de sessenta), queda do Estado Novo e a Revolução dos Cravos.
Não por acaso, mas exatamente porque assim tinha que ser. A minha avó, uma então Senhora, à época, dona de uma paixão que não lhe era permitida, mas, pelo contrário, oprimida, abafada e silenciada, o jornalismo, vivia em segredo a sua liberdade: a que a escrita lhe permitia. Entre palavras, tudo podia ser, até o que não era, ou quem não era. Prova disso são os muitos artigos que não assinou.
O desejo de uma Mulher, ser jornalista e livre, viria a ser a sua maior prisão. Num antagonismo vicioso que a acompanhou até ao seu último dia.
Também em segredo, na maioria das vezes, mantinha a sua grande admiração por Mário Soares e, já sem segredo, o seu apreço e respeito a Jorge Sampaio. Os artigos que não redigiu, recortou e guardou, os jornais para onde não escreveu, comprou e colecionou, as palavras que não libertou leu e deixou... numa compilação de História agora descoberta.
Conhecer as nossas raízes e aqueles que nos antecederam, permite-nos uma melhor compreensão das gerações seguintes, onde nos incluímos. O modo como olhamos a História, assim como a conexão que travamos com ela, facilita-nos a narrativa identitária, autêntica e fundamental à compreensão do "eu". Ninguém nasce de geração espontânea.
Na vida, há sempre um futuro que nos leva ao passado.
É certo que a tendência de nos projetarmos além, é muito mais forte do que o nosso desejo e interesse em olhar para trás. Acreditar que os nossos pais, avós, bisavós, por terem vivido épocas diferentes, não têm nada para nos ensinar é absolutamente falacioso. São eles que nos dão, muitas vezes, se assim o aceitarmos, as ferramentas para melhor entender a nossa experiência e desafios presentes. (Também os futuros).
Claro que, cada época influenciará, em parte e de formas diferentes, maneiras de ser e estar. Condicionalismos distintos, mas com desafios tantas vezes iguais. Caminhos contínuos, mesmo que pertença, a alguns, a intenção deles se desviar.
A compreensão do ontem, a janela do amanhã.
Escreveu José Mário Branco, "Eu vim de longe/ De muito longe/ O que eu andei p'ra'qui chegar".
Fotografia: Jornal Expresso