A Pobreza Ou O Reflexo De Uma Realidade Pandémica?
Filipe Vaz Correia
No centro de Lisboa, onde moro, tenho notado um aumento de sem abrigo, uma percentagem maior de gente a pedir, na sua maioria gente jovem, de ar adoentado, diria mesmo, drogados.
Se aglomeram à porta de supermercados, nas esplanadas de restaurantes...
Uma consequência do Covid e dessa ausência de pessoas em alguns pontos mais turísticos da capital.
Muitos que arrumavam carros ou se dedicavam a pedir pelos pontos mais turísticos de Lisboa, não têm agora pessoas para o seu "peditório", formas de alimentar a sua fome ou seu vício...
Não defino a motivação, pois se alguns o fazem para "matar" o seu vicio, estou certo que em muitos casos encontramos pessoas desafortunadas que apenas precisam de uma refeição.
Enfim...
Num destes dias, à porta de um desses supermercados, um desses jovens pedintes se aproximou de uma senhora que saía daquele local, enquanto eu por ali passava, num rápido gesto lhe apontou o copo das esmolas...
A senhora rapidamente disparou:
- Hoje não pode ser! Esta resposta logo indicava que deveria ser alguém que por norma contribuía para o mesmo rapaz.
Diante destas palavras, este agressivamente respondeu:
- Então por hoje não te apetecer, eu tenho de passar fome?
Fiquei boquiaberto, enquanto, o mesmo rapaz partiu em perseguição da senhora, rua a fora, insistindo para que esta lhe desse dinheiro.
Fiquei a pensar...
Isto valha-nos Deus!
Uma das maiores preocupações que subiste em mim, tem a ver com a hecatombe económica que se aproxima deste nosso País, do Mundo, e que poderá fazer resvalar a nossa sociedade para um radicalismo absolutamente indescritível.
As imagens do Drº Jivago, na Moscovo e São Petersburgo de 1917, nunca me abandonaram desde o dia em que pela primeira vez vi este magnífico filme, protagonizado por Omar Sharif.
As ruas pejadas de miseráveis, ao frio, na neve, com fome...
Os salões de baile a tocar, a nobreza a celebrar, faustosamente, sem se aperceberem que os seus algozes acumulavam desespero e raiva, por entre, a faminta existência de suas almas.
Neste caso, que vivi, sobrou em mim a estupefacção perante a arrogância de tal "pedinte", o receio e fuga da senhora quase obrigada a dar, aquilo que não sabemos se teria para dar...
E neste absurdo pandémico, carregado de desnorte e receio, vivemos todos, cada lojista, cada casa, em cada família.
Esta incerta certeza do que nos espera como País e Sociedade.
Filipe Vaz Correia