A Revolta dos Beijinhos
Triptofano!
Quando a Bastonária da Ordem dos Enfermeiros foi espetar uma beijoca em André Ventura no Comício do Chega, toda a gente se insurgiu e quase que houve um motim a nível nacional.
Uns porque era uma vergonha a Bastonária de uma Classe Profissional dar-se a estas promiscuidades com o líder de um partido tão persona non grata, outros porque se ela tinha sido convidada para ir enquanto BOE no domingo não devia ter aparecido enquanto pessoa individual no sábado, e ainda quem quase que rebentava de fúria por ter dado um simples beijo na cara em vez de lhe ter espetado um linguado que deixasse o homem sem ar.
Pessoalmente, se eu estivesse nos sapatos de Ana Rita Cavaco, e fosse assim friend forever de André Ventura, mandava-lhe um WhatsApp com uma carinha sorridente e um GIF com unicórnios e arco-íris, evitando aparecer em tudo o que era capa de jornal e discussão inflamada de Facebook. Na sociedade em que vivemos ainda é muito difícil fazer-se a dissociação da pessoa e do cargo, por isso Ana Rita Cavaco por mais direito que possa ter a ser Ana Rita Cavaco - Indivíduo acabará por ser sempre rotulada como Ana Rita Cavaco - Bastonária.
Mas isto tudo para dizer que a BOE acabou por, ao falar desta "polémica", abordar um assunto bastante relevante, que é as pessoas revoltarem-se com beijinhos mas ficarem caladinhas no seu canto com situações que verdadeiramente impactam o bem estar da sociedade, como é o caso dos lares.
Se alguém ousa dar um beijinho, um abraço ou mesmo um piscar de olhos a André Ventura é o fim do mundo em cuecas - e pessoalmente eu não sou adepto do senhor, porque alguém que faz reuniões com os seus seguidores numa sala com uma foto dele pendurada na parede leva o termo narcisista a outro nível, mas se falamos de temas por exemplo de saúde, como os lares, os medicamentos hospitalares ou a vacinação, as vozes humanas calam-se e só se ouvem os grilos.
Faz falta as pessoas escolherem melhor as suas lutas, informarem-se do impacto que certas decisões poderão ter na sua vida e na dos outros, e tomarem acções concretas.
Não é só dizer que está tudo mal por causa de Governo A ou B, mas sim pensarem em medidas realísticas que possam trazer maiores benefícios à comunidade, e, de forma individual ou colectiva, fazerem chegar essas ideias a quem nos representa nos órgãos de poder. Basicamente é fazer política sem para que isso tenhamos de ser políticos de profissão.
Claro que ficarmos ao nível da revolta dos beijinhos é mais fácil e dá menos trabalho, mas tendo em conta que temos a sorte de viver numa sociedade onde podemos expressar a nossa voz, é mesmo desta forma tão banal que queremos que ela seja ouvida?