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sardinhaSemlata

Um espaço de pensamento livre.

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06.03.21

Caldeirada Com Todos... “Isabel Paulos”


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O país

Não fazia ideia o que escrever quando recebi o gentil convite do Robinson Kanes. Como o país aparenta celebrara libertação dos piores dias da pandemia - apesar de Portugal ocupar o 9º lugar quanto a óbitos por milhão de habitantes –, e os portugueses regressam ao oásis usual, pensei pintar a nação das cores que a sinto. Logo reconsiderei por não querer afugentar clientela desta generosa casa.

Decidi coibir-me das habituais diatribes à recusa nacional pelas regras básicas de higiene financeira e criticas às fracas elites, das quais brotam os nossos governantes e acólitos, e recorrer aos sábios números da Pordata - grande conquista dos últimos anos. Consultei durante duas horas as estatísticas nacionais no quadro europeu e resolvi lançar o repto: quais são as razões que explicam o nosso atraso e eterno descontentamento?

No retrato do país, começo por pequena vingança. Temos uma esperança de vida de 81.5 anos, estando na média dos países europeus. Mas tratando-se da esperança de vida das mulheres subimos para posição honrosa, com uns valentes 84.5 anos. Deve ser a recompensa por aturá-los.

No que diz respeito ao salário mínimo estamos a meio da tabela entre os países da UE. Mas caímos quase para o fundo da lista quando se fala em remuneração média dos trabalhadores por conta de outrem. Parece confirmar-se que temos sido bastante eficazes nos últimos vinte anos a dar cabo da fornada de classe média gerada, com ajuda dos fundos europeus, nos anos 80 e 90. Não deixamos de receber fundos e escaqueiramos o país com afinco.

Ocupamos nada honroso 5º lugar em matéria de desigualdade na distribuição do rendimento. As posses dos mais ricos são uma miragem para os mais pobres. No que toca à população em risco de pobreza e exclusão social estamos acima do meio da tabela, o que é mau sinal.Apesar disso em Portugal consome-se mais do que a média.

Confesso ter ficado admirada ao verificar que somos mais inquilinos do que proprietários quando comparados com o resto da Europa. E não somos dos que mais gastamos em alojamento.

Sendo Portugal um dos países com menor população activa por cada idoso – o tão falado índice de sustentabilidade -, não é de espantar que seja o 5º país que mais gasta em pensões no quadro europeu, estando a meio da tabela no arrecadar de contribuições sociais.

Portugal está no pódio da Europa de países com mais médicos por 100.000 habitantes e é 5º país com mais pessoal ao serviço das polícias. A despesa pública com a educação está na média europeia. Um pouco acima da média no número de pessoas a trabalhar em educação. E um pouco abaixo de meio da tabela no número de magistrados por 100.000 habitantes.

Sabemos estar em maus lençóis quando damos por nós à míngua de riqueza criada pela produção (produtividade) ao mesmo tempo que temos a 6ª maior carga horária de trabalho. No investimento pelas empresas, incluindo em inovação, não estamos mal cotados, mas em matéria de despesas da empresa com os trabalhadores ficamos abaixo da média.

Somos o 9º país com maior dívida pública e temos a 3ª maior dívida bruta em percentagem do PIB. Ainda assim, estamos a meio da tabela no arrecadar de impostos sobre o rendimento - IRS e IRC. O lema é: paga e não bufa.

Não é novidade que somos um dos países com energia mais cara e não vale a pena o argumento das casas mal construídas. Pouca energia elétrica é destinada às famílias no quadro europeu comparado. Gastamos pouco e pagamos muito. Mas que interessa isso? Em casa a tiritar ou a pelar mas com bons índices de acesso à internet.

Somos o país com maior área ardida. Deixamos a léguas os outros países do sul com as mesmas condições climatéricas. Mas queremos lá saber, já fugimos quase todos do interior usando os muitos quilómetros de auto-estradas (5º lugar). Já não podemos dizer o mesmo quanto à extensão de linhas ferroviárias. E somos o 2º país com maior percentagem de lixo produzido pelas famílias.

O que nos vale mesmo são as remessas dos emigrantes: Portugal é o 1º na lista dos países que mais recebem dos emigrantes. Pode ser que com o dinheiro que mandam possamos dar um arejo, para compensar a nossa baixa performance nas viagens de turismo.

 Nota: a maioria dos dados não se refere ao ano de 2020, mas a 2018 e 2019.

 

Isabel Paulos, 4 de Março 2021.

 

 

 

3 comentários

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    Robinson Kanes 06.03.2021

    Alguns pontos que me interessaram bastante... Conto pelos dedos as pessoas que conheço sem casa própria... Temos, como em qualquer país "armado ao carrapato", a sede da propriedade. Confesso que os factos foram contra aquilo que observo. Porém, esses números incluem empresas e particulares ou só particulares?


    Outros números, deixarão muitos com um nó no estômago e quem os divulga não tem espaço de opinião como quem os esconde... Falo dos médicos e dos polícias. Até temos que cheguem, ou seja... Má gestão! Má gestão que, no privado, é um convite para ir para outro desafio... 


    Finalmente... E confesso que aqui até posso exagerar, mas é estranho que no país onde os números da pobreza envergonham qualquer um (alguns adoram e gostam de empolar a pobreza porque...) se consuma tanto é se produzam tantos resíduos... Em Portugal ninguém morre à fome (e isso custa muito a admitir porque as Misericórdias e os Bancos Alimentares enriquecem com a fome), mas somos um país pobre com consumos e comportamentos que deixam um Dinamarquês, um Alemão ou até um Americano endinheirado a pensar se não é melhor vir viver para Portugal! 
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    Isabel Paulos 06.03.2021

    A referência aos números de proprietários versus inquilinos diz respeito apenas às famílias (particulares). Não consultei os números no caso das empresas.


    Os números dos médicos confirmaram as minhas suspeitas, e devo dizer que antes da pandemia muito me encanitavam as constantes reportagens sobre a falta de recursos humanos nos hospitais. Tenho exactamente a mesma sensação: má gestão. E claro agenda corporativa a passar de encomenda nas televisões, num país hipocondríaco (opinião que tenho antes da covid) que venera tudo quanto envolve a medicina.

    No caso das polícias confesso que não tinha consciência. Mas um amigo professor já me tinha chamado a atenção para a situação e, aliás, dado uma ideia diferente da realidade do ensino no país.


    Quanto à pobreza e ao consumo ainda se torna mais estranho do que diz, quando consultamos os dados da poupança e verificamos que até temos alguns hábitos de poupança. Esta coisa das estatísticas é muito elástica e mil cautelas são poucas ao tirar conclusões. Garanto-lhe que tenho a mesma perplexidade… que aliás confirma a que já tinha ao lidar com pessoas com rendimentos muito baixos que parecem ter sempre o suficiente (ou mais do que suficiente) para consumir. Antigamente explicava a coisa com a nossa tendência para o ‘biscate’, mas esta realidade está longe de explicar tudo. Sempre me pareceu o milagre da multiplicação.

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