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sardinhaSemlata

Um espaço de pensamento livre.

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16.05.20

Caldeirada Com Todos... “Pedro Azevedo”


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Não há nenhum povo que se possa gabar de ter tantos tudólogos por Km2 como o português. Aliás, estou absolutamente convicto de que a sorte do resto do mundo é Portugal só ter 92 000 Km2, área manifestamente não suficiente para abrigar tantos crânios e razão que leva tantos portugueses não tão dotados em tudologia a emigrar todos os anos para assim poderem partilhar com o resto da Humanidade o seu ainda assim douto conhecimento e capacidade de trabalho. É também por isso que anualmente somos invadidos por tantos turistas e agora também por residentes não habituais, uns e outros empenhados de tal forma em absorver a nossa ciência que ou voltam todos os anos ou fixam morada por cá para nos poderem estudar melhor e connosco aprender. De facto, a um tudólogo português não lhe basta ter uma opinião sobre tudo, é também necessário ajuntar-lhe um facto, ainda que esse facto não tenha necessariamente que condizer com o facto original e único. Confusos? Devem ser estrangeiros, pois confusão é um estado em que nenhum português cai. Antes pelo contrário. A outrospovos a quem a dúvida alimenta a curiosidade e é vista como um caminho para a sabedoria, os tudólogosportugueses contrapõem as suas convicções. E os seus “factos”.

 

Pouco importa a maioria dos portugueses não saber calcular um juro, quase todos são mestrados em finanças e botam opinião sobre bancos, acções ou o papel do Estado na economia. Vai daí, invejosa, a Standard&Poor publicou um ranking mundial de literacia financeira onde colocou Portugal no 131º lugar. Atrás do Burundi. Não se faz, tentar destruir assim o nosso moral. Nada que nos abale, porém, deve ter sido da tradução…  É que para um português não se trata apenas de falar sobre o que não sabe, trata-se de falar sobre o que não tem. É verdade, os portugueses adoravam “ter”. Talvez por isso venerem tanto o ter e quem o tem. Muito mais do que o “ser”. E queiram também ter. Ainda que para o ter, o bem comum por vezes se perca pelo meio.

 

Outra actividade em que os portugueses são especialistas é a da saúde. Anos e anos de experiência a automedicar-nos deve ter tido alguma influência nisso, mas ainda assim precisávamos de uma experiência radical que nos desse azo a desbobinar todo o nosso conhecimento. Eis então chegada a oportunidade pela qual (des)esperávamos: o Coronavírus. E de repente brotaram portugueses especialistas em interpretação de gráficos, os Nostradamusda estocástica. Ele é médias móveis, é números de Fibonacci, são as Bollinger Bands, o RSI, tudo ferramentas matemáticas com que os portugueses complementam os seus conhecimentos médicos e fazem projecções sobre a evolução da doença (Covid-19) subjacente ao vírus. É que não sei se há portugueses hipócritas, mas aparentemente todos fizeram o Julgamento de Hipócrates. Só assim aliás se compreende a nova indústria de máscaras caseiras, às bolinhas e risquinhas, que andam por aí, cada uma com a sua especificação à vontade do freguês. Ou paciente, não tivesse o português uma paciência de 9 séculos.

 

Não haja dúvidas: esta nova gesta de portugueses é muito superior à de um D. João I, D. João II ou D. Manuel. Quais Descobertas, quais quê! Para que é que Vasco da Gama foi para o Oriente ou Pedro Álvares Cabral para o Ocidente quando aqui, neste rectângulo à beira-mar plantado, já existia tudo o que precisávamos? Especiarias? Já tínhamos os especialistas do tudo, que com as especiarias partilham o mesmo étimo, a mesma origem (“specie”). E não há, nem nunca houve no mundo, uma espécie como o “tudólogo português”. A nossa valiosa contribuição para o Universo. Brevemente, numa televisão ao pé de si. Agora aprendam!

P.S. Mesmo com tantos tudólogos, não há país como Portugal. O meu país.

 

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