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sardinhaSemlata

Um espaço de pensamento livre.

sardinhaSemlata

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12.02.21

Com sombra de dúvidas


JB

 

 

    Em 276 a.C., Cirene era uma cidade vibrante. Situada no Norte de África, perto de onde hoje é a Líbia e com o mar Mediterrâneo à porta, o seu porto e mercado eram ponto de encontro de muitas pessoas diferentes. Foi precisamente em 276 a.C. que nasceu Eratóstenes; um bébé aparentemente normal mas com uma combinação de características extraordinárias. Destaco três : espírito crítico, curiosidade e iniciativa. 

   Com estas qualidades era fácil prever que Eratóstenes chegaria longe e assim foi. Chegou mesmo a ser diretor da prestigiada biblioteca de Alexandria. Segundo alguns historiadores o grande 'insulto' que lhe faziam na época era "é o segundo melhor em tudo". O que, sejamos honestos, ao nível de insultos não é o melhor que se pode fazer...  Eratóstenes era um homem muito culto e inteligente, um filósofo, um cientista. Mas havia mais como ele, homens (e embora não se fale tanto delas, certamente também mulheres) de grande valor, era uma época gloriosa da humanidade.
  Aquilo pelo qual hoje o destaco não tem a ver com essas qualidades tão importantes, mas com outras, mais discretas. 

  Numa noite como tantas outras, Eratóstenes estava a ler manuscritos, que muitos já tinham lido antes. Num desses manuscritos, leu a descrição de que na cidade de Assuão, no dia do solstício de verão (ou seja no dia mais longo do ano) exatamente ao meio dia, os objetos deixavam de fazer sombra porque o sol incidia diretamente por cima. Leu a descrição de um facto curioso, mas aparentemente banal, de que quando se olhava de cima para a água do poço da cidade, se podia ver diretamente o sol e as bordas do poço não faziam sombra. Eratóstenes ficou muito intrigado: vivia em Alexandria que era mais a norte de Assuão e no seguinte solstício de verão, exatamente ao meio dia, decidiu observar e registar se os objetos em Alexandria faziam sombra . Finalmente chegou o dia do solstício de verão e Eratóstenes viu que em Alexandria os objetos projectavam uma sombra a um determinado ângulo, que mediu e registou. De seguida contratou um itinerante, um homem com passadas muito regulares e com a profissão de medir distâncias, para saber a quantidade exata de passos entre as duas cidades. 
  Relembro que isto se passa tudo umas centenas de anos antes do nascimento de Cristo!  

  O itinerante voltou! Certamente exausto mas com a medida, 5040 estádios. Traduzindo para os dias de hoje: 800km.

 Armado com o conhecimento do ângulo da sombra feita pelo sol em Alexandria ao meio dia no dia do solstício e da distância para a cidade em que esse ângulo é zero, usando uma equação simples, Eratóstenes determinou nada mais nada menos de que o comprimento da terra é de 252000 estádios, que é como quem diz 39700km. Isto não é incrível?  Quando hoje, 2200 anos depois disto, 500 anos depois de Fernão de Magalhães ter dado a volta ao mundo, sabemos que a circunferência do nosso planeta é de 40008km. Um homem curioso munido de senso comum e ferramentas primitivas, há 2300 anos atrás descobriu o comprimento da terra com a sua cabeça um papel e uma caneta (ou o equivalente na altura porque ainda nem canetas havia) e só errou por pouco mais de 300km. Fico doido.

  Imagino esse tempos gloriosos da humanidade: reis filósofos, debates nas ruas, ciência, filosofia...     Depois vieram os bárbaros, as invasões, a selvajaria e a ignorância e durou milhares de anos. Ganhou o medo. 
 

JB 

  

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