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sardinhaSemlata

Um espaço de pensamento livre.

sardinhaSemlata

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11.06.20

Crocodilos, lontras e outras criaturas.


Triptofano!

Quando era novo tinha um sonho, ou melhor dizendo, pesadelo, que era recorrente, e me fazia levantar da cama com o coração a saltar-me do peito e o pijama encharcado em suor.

Consistia na minha pessoa, alegre e sorridente, a dar um maravilhoso passeio de helicóptero, muito provavelmente influenciado pela Catarina Furtado e a sua Caça ao Tesouro.

A certa altura da viagem, o helicóptero começava a fazer um barulho estranho e a queda afigurava-se inevitável, e para piorar a situação onde é que o helicóptero ia cair? Num lago cheio de crocodilos, daqueles gigantescos, com ar de quem nasceu na altura dos dinossauros e por cá ficou, com as bocarras abertas prontos para me devorarem. Felizmente acordei sempre antes de acabar na boca do crocodilo, e nunca experienciei, mesmo que em sonhos, como seria ser comido por tal bicho.

Até os dias de hoje o meu maior medo em relação a morrer é servir de refeição a um destes répteis. É algo irracional, que transcende a minha capacidade lógica, por isso podem imaginar como fiquei quando nas notícias anunciaram que um maravilhoso crocodilo tinha sido avistado no rio Douro.

Comecei logo a pensar que podia estar muito bem de férias, a dar um mergulho no rio ou simplesmente a aproveitar para lavar umas cuequitas e pimba, aparecia o fdp do bicho e comia-me. A minha única esperança era que eu lhe causasse azia para ele não se ficar a rir.

Afinal parece que o temido crocodilo é uma lontra, que apesar de não ser aquela fofura que toda a gente pensa não é nem de longe de perto tão assustador como o réptil.

E porque é que eu estou para aqui a falar destas criaturas? Simplesmente e somente para reflectirmos sobre como as fake news, mesmo quando divulgadas sem malícia, podem-nos levar a tomar atitudes diferentes daquelas que numa situação normal tomaríamos.

Por exemplo, se eu tivesse marcado férias para a zona onde o crocodilo estava iria correr a desmarca-las e alapava-me ao sofá de casa e nada nem ninguém me iria conseguir tirar de lá. Da mesma forma que se eu até simpatizasse com um partido político mas viesse outro dizer que era ele que ia tirar o país do fosso e que tinha a solução para a minha tristeza, agonia e comichão hemorroidal então provavelmente eu até lhe dava a minha cruzinha só para ver no que dava.

Hoje em dia a informação que nos chega não é toda isenta, por mais que nos tentemos convencer disso. Existem forças, lobbies, interesses e ordens mundiais ocultas que tentam emprenhar-nos pelos olhos. Cada vez mais importante é analisarmos, reflectirmos, ponderarmos, questionarmos, percebermos quem diz o quê e porque é que o diz.

Nos tempos que correm, tão importante é pensarmos por nós próprios como termos a capacidade de analisar os pensamentos dos outros, de forma a procedermos ao que eu chamo de descascanço da cebola. Depois de tirarmos as camadas superficiais o que é que se esconde lá por dentro? Serão as intenções externas similares às internas?

Um dos locais mais fáceis de se assistir a uma gravidez porque quase ninguém usa método anticoncepcional é o Facebook. Local onde as pessoas fazem juízos de valor só por lerem um título de uma notícia - ler a mesma é um desafio intelectual demasiado difícil - e em que todos são especialistas de tudo e mais alguma coisa, independentemente de nunca terem pensado antes no assunto em que estão furiosamente a opinar.

Confesso-vos que gosto de ler os comentários do Facebook, mas é um gosto sádico, porque se por um lado me divertem por outro deixam-me com uma sensação de que nem com mais duas inundações e uma chuva de meteoritos a humanidade de salvava.

É interessante ver as criaturas, muitas vezes irremediavelmente acéfalas, que aparecem nesta rede social, a descarregar todas as frustrações, ódios e intolerâncias.

Mas isto se calhar sou eu que sou negativista, que Portugal até é um país onde supostamente não há racismo, nem xenofobia, nem homofobia nem nada dessas modas que só são criadas para fazer com que as minorias se tornem a maioria e escravizem as antigas maiorias tão tolerantes e bondosas e tudo e tudo.

Se estão de nariz torcido a ler este último parágrafo desafio-vos a ler os comentários desta publicação do Facebook. Depois digam-me o que é que acharam. Eu começo a pensar que se calhar ser comido por um crocodilo não é assim tão mau.

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