EXPOSIÇÃO ADEUS, PÁTRIA E FAMÍLIA
The Travellight World
A exposição Adeus Pátria e Família, patente no Museu do Aljube, em Lisboa, já inaugurou há muitos meses, mas só recentemente tive a oportunidade de a visitar.
Interessa-me muito a forma como as sociedades se transformam e os processos que conduzem à alteração dos seus usos e costumes. Não podia portanto, deixar passar esta exposição que revela como evoluíram na sociedade portuguesa, as dinâmicas e tensões entre a repressão e as resistências de diversidade sexual e de género durante a ditadura e após a Revolução do 25 de Abril.
A exposição está montada num percurso em espiral, que seguimos passando por entre telas brancas translúcidas, o que nos permite, de uma forma original, ver a mostra e ao mesmo tempo o vulto dos outros visitantes.
Joana Alves, uma das curadores do Adeus Pátria e Família explica que a intenção das telas translúcidas é tornar percetível a presença do outro, sem nunca se conseguir ver exatamente quem ele é. Ou seja “desenha-se uma visibilidade feita de invisibilidade”, numa alusão à relação entre a opacidade e a visibilidade da comunidade LGBT na sociedade portuguesa.
Nas telas que funcionam como as paredes do corredor em espiral estão afixados por ordem cronológica diversos documentos que ajudam a contar esta história, desde recortes de jornais, a legislação da época, passando por fotografias, textos censurados e dados estatísticos.
O ponto de partida é “A lição de Salazar”, um poster de propaganda do Estado Novo, no qual se vê um homem a voltar do trabalho, a mulher nas tarefas domésticas, o filho com a farda da mocidade portuguesa e a filha a brincar de dona de casa — A leitura que a ditadura fazia da família perfeita.
O núcleo seguinte mostra, de um lado, a repressão e, do outro, a resistência, “porque uma coisa não existe sem a outra” diz Joana Alves.
Há por isso documentos que revelam o enquadramento jurídico e legal da repressão de todos os que não se enquadravam na norma, e que eram “considerados transgressores”, e documentos que nos dão a conhecer as formas de luta e resistência que estes mesmos “agressores” engendraram para sobreviver numa sociedade que não os queria e por isso perseguia, vigiava, prendia e torturava.
O núcleo “Antes de ser orgulho foi revolta” aborda o contexto internacional da luta pela igualdade de direitos e o núcleo “25 de Abril 1974, e agora?” mostra como a Revolução dos Cravos “derrubou um regime, mas não a sua herança cultural”. Foi uma promessa de liberdade e igualdade que se concretizou na conquista dos direitos de casamento, união de facto e adoção por parte de casais do mesmo sexo, mas que se mostra impotente para impedir crimes horríveis como o assassinato da transexual Gisberta... Talvez por isso, ou por isso mesmo, a fechar a exposição, há um conjunto de dados estatísticos atuais sobre a discriminação ainda existente e um mapa que mostra as leis sobre esta matéria no mundo.
Fotos: Travellight | Exposição Adeus, Pátria e Família | Museu do Aljube
Neste ano, agora a terminar, em que celebramos, pela primeira vez na nossa história, mais dias vividos em liberdade do que em ditadura, uma visita à exposição permanente do Museu do Aljube, complementada com a visita à exposição temporária Adeus, Pátria e Família, é essencial para não esquecer quem com coragem e determinação, muitas vezes à custa da própria vida, lutou ( e ainda luta) para que essa liberdade exista.
Museu do Aljube Lisboa
Até 29 de Janeiro de 2023
Entrada gratuita de terça a domingo das 10h00 às 18h00