Faina
ó menina
Há na estação uma livraria. Fins de coleção, livros manuseados, velhos, caros, baratos... alinham-se em mesas e escaparates num pavilhão ensolarado .Comprei "Os Pescadores" do Raul Brandão.
Apanhei um daqueles comboios alugados a Espanha. Os bancos estão encardidos e as paredes das carruagens também, nem a mais profunda limpeza com jatos de água as deixaria brancas. As portas automáticas, matreiras para os incautos, parecem incompreensíveis para os mais velhos que ficam ali a tentar forçar a entrada no compartimento. A senhora das pulseiras e fios de contas largas e coloridas bem tentou forçar passagem mas o corpo já não encontrava o ponto de equilíbrio necessário para abrir caminho. Demovi-lhe o gesto, dei-lhe passagem e no momento da saída ensinei-lhe o truque do botão vermelho.
'Obrigada, filha. Não estou habituada a estas andanças.' - disse-me.
'This side' 'This side' repeti, batendo com a mão na janela. Asiáticos, nórdicos, brasileiros todos queriam a melhor vista para o rio e eu que conhecia o comboio parecia-lhes a pessoa certa para os apresentar.
'Ei! Eu conheço isto!' Espantou-se o pequeno ao ver a localidade que normalmente só vê de carro. E, espantou-se outra vez quando o dia e a noite se alternaram ao atravessar o túnel, nove túneis.
'Olha os cruzeiros! Vamos deixá-los para trás, somos mais rápidos que os cruzeiros...'
'Este rio tem peixes?' - Perguntou o pequeno.
Disseram-lhe que sim.
'E os pescadores? Onde estão os pescadores?'
Confesso que os comprei mas não os tirei da mala.
Nota:
fai·na
substantivo feminino
1. Trabalho da tripulação de um navio.
2. [Por extensão] Trabalho aturado; lida.
3. [Antigo] Cortesia, mesura.
in Dicionário Priberam