Por mares sempre navegados, ainda Adamastor
Sarin
Ser português
é sentir na pele o fado
da eterna saudade do mar.
Gosto destes versos. Parecem profundos, cheios, envolventes. Sendo meus, posso afirmar com absoluta certeza: são vazios.
Porque ser português é definição pessoal, não identidade nacional. Aliás, que identidade nacional? A que suspira de saudade pelo império? Não é minha, certamente. A que se orgulha de 900 anos de História? É a minha História, trouxe-me aqui - mas não me orgulho dela, na exacta medida em que também não peço desculpa por ela. Aceito-a, abraço-a, há muito conciliada com as injustiças cometidas, com as oportunidades perdidas, com o engenho e com a arte que temos e perdemos por vistas tão estreitas como o nosso país, esta faixa continental que se continua pontilhada mar adentro.
O que é a Cultura Portuguesa que não um caldo onde cabem fado e cante e pimba e pauliteiros e fandango e corridinho e choradinho por esta tão triste vida? Onde cabem todos e tudo sem que a deixemos de sentir nossa?
Porque, caramba, o que nos é mais comum será talvez, e afinal, a capacidade de abraçar outras culturas e, no fim do dia, conseguir suspirar em português.
Sou Portuguesa e, de tanto que gostaria de pudéssemos ter, não quereria ser outra coisa - mesmo que não conseguindo definir uma identidade nacional, ainda que deplorando a marcha contra os canhões no Hino que me comove.
Gosto deste meu canto, gosto deste nosso sol. E gosto do calor que me alenta quando reconheço o tal abraço nos pequenos gestos dos meus patrícios.
Tal como para Pessoa, a minha pátria é a Língua Portuguesa. Mas, ao contrário do poeta, eu tenho sentimento político e social. E se a minha pátria é a Língua, a minha nação é a História e a Cultura, é o sangue e é o solo, são as pessoas. Não vejo como ser portuguesa sem me preocupar com Portugal, não sei ser portuguesa sem me importar com os portugueses. Os que cá e os que lá fora.
E se ser português for outra coisa qualquer, por favor avisem-me. Talvez ainda vá a tempo de ser celtibera, que para bera basta deixar que decidam por mim o meu país.
Celebrem o país de Camões como melhor vos aprouver, hoje que se cumprem 440 anos sobre a sua morte. E fiquem bem, fiquem muito bem. Por aqui, fiquem com Jorge Palma.