The Handmaid's Tale
The Travellight World
Nas últimas noites ando a ver de enfiada “The Handmaid's Tale”, uma série de televisão americana criada por Bruce Miller, baseada no romance homónimo de 1985 da autora canadiana Margaret Atwood. A série não é recente, começou no final de 2016 e já vai na 5 temporada, mas eu nunca a tinha visto.
A história tem lugar num país chamado Republic of Gilead, uma sociedade totalitária, localizada no que costumava ser parte dos Estados Unidos e que é governada por um regime fundamentalista que trata as mulheres como propriedade do Estado e vê nisso a solução para travar uma taxa de natalidade em queda. Nesta distopia as poucas mulheres férteis que restam no território (porque não conseguiram fugir) são forçadas à servidão sexual e não tem o direito sequer de estar com os seus filhos.
“The Handmaid's Tale” acompanha as lutas de June para se libertar do regime, recuperar as suas filhas e fazer justiça.
É um mundo aterrador que de inicio me pareceu impossível e distante, mas que depois de uma reflexão mais ponderada me parece tristemente próximo.
São tantos os atropelos aos direitos das mulheres a que temos assistido ultimamente — reversão do direito ao aborto nos EUA; proibição de ir à escola das meninas no Afeganistão; uma rapariga morta no Irão por não cobrir bem o cabelo; 11 homens, na India, soltos da prisão depois de condenados a prisão perpétua por violação em grupo de uma mulher e assassinato de toda a sua família; 2.800 mulheres este ano desapareceram no México (e o ano ainda não acabou), um aumento de 40% comparado com 2017…
Sim, é mau, é terrível, mas ainda parece lá longe, distante, até que olhamos mais perto e vemos o video viral de uma tradicional residência universitária madrilena, frequentada pela classe média alta do país vizinho, onde dezenas de jovens rapazes estão na janela a ofender colegas de uma residência feminina chamando-lhes de p***s e outras coisas e garantindo que nas festas universitárias elas vão “cair nas mãos deles”….
Se olharmos mais perto ainda, em Portugal, até temos vontade de chorar com as estatísticas: Só em 2021 foram registados 54 casos de violência doméstica por dia, sim, por dia, sem contar com as que nunca chegam ao conhecimento das autoridades. A maioria dos crimes foi cometida por homens entre os 25 e os 54 anos e, que tal como as vítimas, possuem ensino superior.
E depois temos os tribunais (ou devo dizer os juizes) a libertar sucessivamente agressores, sejam primários ou reincidentes como a Relação do Porto que se recusou a afastar de casa um homem que terá agredido a mulher durante 50 anos, por não saber se este tinha outro local para viver!
Talvez estas situações sempre tenham existido, mas a diferença é que agora as mulheres não estão mais para “aceitar e calar”. Hoje falamos, gritamos, exigimos atenção, para que as nossas filhas, netas, bisnetas, não tenham de viver num mundo semelhante ao que é visto no “The Handmaid's Tale”.